Documentos oficiais divulgados no Portal da Transparência e no Diário Oficial dos Municípios do Paraná revelam que três integrantes da mesma família exercem atualmente cargos de chefia na Prefeitura de Matinhos. A mais recente nomeação foi assinada pelo prefeito Eduardo Dalmora (PL), aumentando os questionamentos sobre a legalidade e a moralidade das indicações.
No dia 25 de junho, o prefeito publicou o Decreto nº 4019/2025, nomeando Adriana Matioli Antonio Amarante como diretora-geral de gabinete, com posse a partir de 1º de julho. Antes disso, Adriana já atuava no mesmo gabinete como Auxiliar de Administração, com salário bruto de R$ 6.822,10, conforme registros públicos.
O marido de Adriana, Claudio Amarante, ocupa o cargo de secretário de Obras e Serviços Urbanos, com vencimentos mensais de R$ 10,5 mil. A filha do casal, Ana Claudia Matioli Antonio Amarante, é diretora-geral da Procuradoria-Geral do Município — embora esteja afastada atualmente por licença-maternidade. Assim, mãe, pai e filha ocupam simultaneamente funções de confiança na estrutura da Prefeitura.
O que diz a lei
O advogado especialista em Direito Eleitoral, Guilherme Ruiz Neto, explica que a Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal (STF) proíbe a nomeação de parentes até o terceiro grau em cargos comissionados na administração pública, com exceção dos cargos políticos — como o de secretário municipal. No entanto, para cargos como os ocupados no gabinete e nas diretorias, a prática pode configurar nepotismo, especialmente se não houver comprovação de qualificação técnica.
“A administração pública deve seguir os princípios da moralidade e da impessoalidade, previstos no artigo 37 da Constituição Federal”, reforça Ruiz Neto. Ele acrescenta que a Súmula 13 deixa claro que cônjuges e parentes de servidores em cargos de direção não podem ser nomeados para funções de confiança dentro da mesma entidade pública.
A prática, segundo o jurista, pode ser enquadrada como improbidade administrativa, passível de sanções como multas e penalidades previstas na Lei nº 8.429/1992. “É preciso analisar cada caso concreto, mas a suspeita de favorecimento familiar é evidente”, ressalta.
O advogado Leandro Oss-Emer, especialista em Direito Penal, também vê margem para apuração legal. Segundo ele, o artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa considera ilícita a nomeação de parentes até o terceiro grau para cargos comissionados, quando houver dolo e relação direta com autoridades nomeantes ou com quem exerce cargos de direção na mesma estrutura pública.
Contudo, Oss-Emer pondera que é necessário avaliar o contexto de cada nomeação, como a existência de justificativas técnicas ou critérios objetivos que sustentem a escolha. “A simples condição de parentesco não basta, mas ela levanta um forte sinal de alerta”, observa.
Ele também reforça que o artigo 37 da Constituição obriga a administração pública a agir com legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência — princípios que, se desrespeitados, podem gerar responsabilização dos agentes públicos.
Quem pode investigar o caso?
Diante da composição familiar nos cargos de chefia, o caso pode ser alvo de apuração formal. O Ministério Público do Paraná (MPPR) pode ser acionado para investigar as nomeações e solicitar documentos, currículos e justificativas técnicas que respaldem as indicações. Caso identifique irregularidades, o MP pode recomendar exonerações ou até abrir ação judicial.
A Câmara Municipal também tem papel fiscalizador e pode abrir discussões sobre a legalidade das nomeações. Embora os cargos estejam distribuídos em diferentes áreas, o arranjo familiar pode ser interpretado como nepotismo cruzado — uma prática em que parentes são indicados em setores distintos para escapar da proibição legal. O STF já se manifestou em decisões anteriores contra esse tipo de manobra.
Por Brayan Valêncio / JB Litoral